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O Brasil e o regime internacional do meio ambiente

Atualizado: 23 de nov.

O porquê da aposta na sustentabilidade

A busca pela estabilização das concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera num nível que impeça uma interferência antrópica perigosa no sistema climático é o objetivo último da 26ª Conferência das Partes (COP-26) da Convenção-Quadro das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas (UNFCCC), que vem sendo realizada em Glasgow desde o dia 31 de outubro e entra agora em seus momentos decisivos. Tal meta deverá ser alcançada, segundo preconiza a própria UNFCCC, num prazo que permita aos ecossistemas adaptarem-se naturalmente à modificação do clima e que assegure que a produção de alimentos não seja ameaçada pela ação do ser humano nos padrões climáticos globais.

Em uma palavra, apenas na hipótese de atingido este objetivo, delimitado e quantificado de forma mais precisa no Protocolo de Quioto e no Acordo de Paris, é que o desenvolvimento econômico poderá prosseguir de maneira sustentável. O papel dos Estados, dos cientistas e dos membros da sociedade civil que neste momento se encontram nos painéis climáticos em Glasgow é justamente propor, debater e acordar, no plano internacional, os meios para tanto.

Para o Brasil, a aposta na sustentabilidade deveria ser prioridade absoluta. Afinal, o Brasil é agente central no histórico das negociações climáticas internacionais e ainda possui um longo caminho a trilhar em matéria de desenvolvimento humano sustentável. Trata-se de uma linha de ação que impactaria diretamente a vida de milhares de cidadãos, vítimas potenciais ou concretas das injustiças ambiental e climática.


Dos protocolos internacionais debatidos nas grandes conferências à vida cotidiana das populações

Há uma razão pela qual a urgência climática é debatida nos grandes foros internacionais e não somente em ações levadas a cabo no âmbito doméstico. A estabilização das temperaturas terrestres é assunto de interesse da comunidade mundial, vez que basicamente todas as partes do globo sofrem, em maior ou menor medida, com os impactos das mudanças climáticas.

Ainda que o trato da matéria se configure na verdadeira gestão de um bem público global, cada lugar do planeta possui suas particularidades. Como já debatido neste espaço, a urgência climática faz com que as populações sejam afetadas pelas dinâmicas provocadas pela ação antrópica – intervenções realizadas pelo homem – de maneira distinta, a depender de fatores como localização geográfica, suscetibilidade a catástrofes naturais e capacidade de resiliência e mitigação de tais impactos. Por isso, é necessário levar em consideração a equidade, representada pela justiça ambiental, nos debates e na implementação do quadro normativo voltado para o atendimento das urgências climáticas.

Tal panorama não significa dizer, contudo, que as nações devam adotar posturas soberanistas no trato da matéria, como se a peculiaridade local justificasse uma abordagem unilateral em relação ao tema, ou mesmo o desrespeito aos ímpetos de sustentabilidade. Em verdade, o soberanismo que minimiza o impacto global das transições climáticas em prol da utilização soberana dos recursos naturais locais é indissociável de práticas onde prevalece o desenvolvimento econômico predatório, justamente a causa última da urgência climática em andamento.

Por isso, é imperioso que se evite uma postura apta a incentivar a devastação ambiental desenfreada, verdadeiro ecocídio. O tratamento cooperativo do tema deve prevalecer, justamente para o bem das respectivas populações locais.


Os brasileiros mais afetados pela urgência climática. Como o regime do meio ambiente os afeta?

Tome-se, neste sentido, o exemplo do Brasil. As condições de vida de vastos contingentes da população brasileira justificam a necessidade de um engajamento ativo por parte da delegação brasileira nas negociações sobre o clima, de forma a se atingirem denominadores comuns que possam melhorar essas condições.

A Contribuição Nacionalmente Determinada pelo Brasil, firmada sob os auspícios do Acordo de Paris (2015), foi atualizada no âmbito da COP-26 e é, segundo o discurso oficial do governo brasileiro, uma das mais ambiciosas metas de redução de emissões do planeta. Entretanto, há evidente descompasso entre os compromissos firmados pelo Estado brasileiro no plano internacional e a política ambiental do atual governo de Jair Bolsonaro, que desarticulou órgãos de fiscalização ambiental, acusou comunidades originárias pelas queimadas ocorridas na região amazônica e estimula sistematicamente a invasão de áreas de proteção ambiental para a prática do garimpo e da agropecuária.

Cumpre reiterar, contudo, que o engajamento do Brasil no plano ambiental deve ser sério e construtivo, e que o regime internacional do meio ambiente tem o condão de contribuir sensivelmente para a melhora dos padrões de vida da população brasileira – logo, é um equívoco colossal assumir obrigações com o objetivo de não as cumprir, ou considerar que assumir compromissos de reduções de emissões é um atentado à soberania econômica nacional imposto pelos países desenvolvidos.

As populações indígenas brasileiras, guardiãs por excelência da maior floresta tropical do planeta, a Amazônica, são as que sofrem de forma mais imediata com a devastação ambiental neste bioma, expressa através de desmatamentos e queimadas. Não apenas a floresta significa o lugar onde os indígenas vivem e trabalham, mas, sobretudo, o seu lar ancestral, sua herança cultural. Proteger as florestas é proteger a identidade dos povos nativos. Mecanismos com o REDD+ – fundo criado no âmbito da UNFCCC para recompensar financeiramente países em desenvolvimento por seus resultados de (R)edução de (E)missões de gases de efeito estufa provenientes do (D)esmatamento e da (D)egradação florestal, considerando o papel da conservação de estoques de carbono florestal, assim como o aumento de seu armazenamento e o manejo sustentável de florestas - são ferramentas vitais para aliar sustentabilidade e proteção da diversidade cultural.

Durante a COP–26, painéis da sociedade civil alertaram para a impossibilidade de se dissociar o trabalho escravo contemporâneo – onde trabalhadores são obrigados a atuar em condições precárias, normalmente propensos ao desenvolvimento de diversas doenças, e muitas das vezes sem serem pagos por isso – das mudanças climáticas. No cenário brasileiro, esses indivíduos são habitualmente encontrados em atividades do agronegócio, no extrativismo e na produção de carvão, cujo lócus de atuação se dá predominantemente na região amazônica. O desequilíbrio gerado nos ecossistemas locais, pois, deve ser debelado por ações conjuntas de mitigação dos impactos de tais atividades predatórias e de garantia da sustentabilidade econômico-social de trais práticas, evidentemente inviabilizada pelo uso do trabalho cativo.

Os moradores de áreas de encostas, geralmente vítimas da segregação espacial nas grandes cidades litorâneas brasileiras, estão entre os que mais sofrem com os efeitos dos eventos climáticos extremos. Mecanismos de mitigação dos impactos das transformações climáticas como o Fundo Verde para o Clima possuem linhas de financiamento diretamente voltadas para a mobilização de recursos, a serem repassados aos países em desenvolvimento, direcionados à criação de capacidades de resiliência face aos impactos de eventos climáticos extremos, como chuvas torrenciais.

Na seara do mundo agrícola, para além dos óbvios impactos causados pelo avanço da agropecuária em áreas de preservação ambiental (fator que contribui grandemente para as emissões brasileiras), o Brasil, como grande produtor de artigos primários, pode ter seus trabalhadores rurais potencialmente afetados pelas oscilações nos padrões climáticos globais. Crises hídricas sucessivas, como a atualmente em curso no país, poderão implicar quebras de safra e demissões em massa no campo – isso apenas para fazer referência aos obreiros que trabalham no latifúndio, altamente mecanizado, vez que o espaço rural brasileiro ainda abarca vastos contingentes de populações que vivem sob regime de subsistência. Ademais, o potencial aumento dos preços dos bens agrícolas na hipótese de choques de oferta implica o aumento dos custos dos alimentos para a população brasileira em geral, piorando ainda mais o já deletério quadro inflacionário atual. Aí reside a importância do REDD++, que alia aos preceitos previamente mencionados o incentivo à agricultura sustentável.


Conclusão

Conclui-se reiterando que a aposta na sustentabilidade e o engajamento construtivo nos debates ambientais internacionais é urgente e inafastável para a atual realidade da população brasileira. Ao criar mecanismos dentro do regime internacional de meio ambiente que atendam às necessidades das populações, o Brasil poderia contribuir decisivamente para a superação da catástrofe climática e pavimentar o caminho para o desenvolvimento sustentável.

Além disso, o engajamento em ações climáticas contribui para a quebra de ciclos viciosos na atividade econômica, medida essencial para a garantia da sustentabilidade em suas três fontes, tal qual consta da própria UNFCCC (sustentabilidade ambiental, econômica e social).

Na atual conjuntura, lutar por uma seguridade social ampliada e integral é pensar tanto na dimensão social, por meio do direito ao trabalho, à moradia e à assistência social, quanto na ambiental, entendendo que todos os cidadãos possuem o direito ao meio ambiente integral, onde este esteja incorporado às diferentes coletividades, de acordo com as suas necessidades


MATERIAL UTILIZADO

https://unfccc.int/conference/glasgow-climate-change-conference-october-november-2021

https://reporterbrasil.org.br/2021/11/trabalho-escravo-alimenta-mudanca-do-clima-alerta-sociedade-civil-na-cop26/

http://redd.mma.gov.br/pt/pub-apresentacoes/item/82-o-que-e-redd

https://www.unredd.net/about/what-is-redd-plus.html

https://www.unep.org/pt-br/sobre-o-pnuma/financiamento-e-parcerias/parceiros-de-financiamento/fundo-verde-para-o-clima

https://www.greenclimate.fund/





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