DIA NACIONAL DO LIVRO DIDÁTICO: o debate da “escola sem partido”
Atualizado: 10 de mar. de 2022
No sistema escolar, o deslocamento para a direita no Brasil se expressou em políticas que assumiram a lógica da individualização, da competição, da dissociação da responsabilidade pelo outro ou pelo que entendemos por fraternidade.
Articularam essas novas concepções com dispositivos neocoloniais de controle ideológico que devolvem à cena privada a politização de questões como a educação sexual integral, ou a concepção da pedagogia como questão política Discursos como os construídos em torno da chamada "ideologia de gênero" foram uma estratégia para desmantelar a contribuição feminista para a radicalização da democracia e desenvolver movimentos e ações que questionam as práticas e a autonomia dos professores.
Isso acontece sob as alianças que os partidos de direita forjam com correntes pentecostais do campo da teologia da prosperidade (criada nos Estados Unidos), alinhadas contra a agenda do movimento feminista com um discurso de defesa dos valores familiares tradicionais e patriarcais, mas sem abandonar seus vínculos com setores empresariais por meio de formatos de institucionalização capitalista. O resultado é o alargamento das lacunas de desigualdade sob novas dinâmicas, acentuadas por meio de modalidades de mercantilização e privatização do sistema escolar.
Na educação, como em outras áreas do conhecimento, o debate se concentrou em como reconhecer as diferenças sem contribuir para desigualdades. O problema é que o reconhecimento dos sexos, como raça ou classe, poderia reificar identidades e prestar um serviço ao separatismo e ao comunitarismo repressivo.
Como as diferenças são interpretadas e qual é o projeto político de uma sociedade para os seus cidadãos têm consequências para a definição que fazemos de conhecimento e na proposta ética de uma educação que tenha como norte a justiça curricular.
Políticas neoliberais e populistas estão impedindo o progresso do feminismo, mudando os processos de transformação do conhecimento e a vida das mulheres, que ocorreram, principalmente tudo, desde os anos setenta a nível global, para uma cultura neoliberal eficiente, mensurável e lucrativo cujo princípio é a liberdade escolha sem barreiras de classe social, etnia ou gênero e que fazer alianças com o capitalismo.
Desde o início, foi identificado dentro do quadro discursivo em questão o protagonismo do grupo denominado “Escola sem Partido” (ESP), surgida durante o governo do presidente Lula, sob um viés de oposição contundente à ideologia da tradição de esquerda, em seu sentido mais amplo, incluindo movimentos reivindicações de identidade de gênero (Rodrigues, 2010).
Nesse sentido, o grupo ESP apresenta como alvo principal o movimento estudantil. O pensamento de Paulo Freire e as identidades de gênero. Para legitimar suas demandas, ele recorre à ideologia liberal, postula que o direito das famílias é superior à autonomia do professor e, com isso, legitima seu papel na denúncia da suposta “doutrinação”.
O arcabouço discursivo neoconservador, cujo ícone é a Escola Sem Partido – com foco especial nas questões de gênero, embora não seja o único assunto. Se você acha que a Ditadura é passado, é porque ainda não conheceu o projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados com o tema “escola sem partido” e os grupos que o defendem.
O texto de um dos simpatizantes do PL diz mais ou menos assim: “Você pode estar sendo vítima de doutrinação ideológica quando...”. A partir daí, são elencados diversos “exemplos de doutrinação”, como o professor ou professora se “desviarem” da matéria objeto da disciplina para abordar assuntos relacionados ao noticiário político ou internacional; a adoção de livros e publicações de autorias identificadas com determinada corrente ideológica; exibição a alunos e alunas de obras de arte com conteúdo político-ideológico etc.
Não bastasse o descaso histórico de governantes com a educação, agora querem fazer patrulha ideológica (ou amordaçar, como na Ditadura) em escolas e universidades brasileiras.
A educação brasileira nunca foi pauta prioritária na história do Brasil. Os atrasos na alfabetização e no acesso ao nível superior, bem como a precarização crescente em todos os níveis de educação, sustentam esta afirmação.
É funcional a direção política adotada por governos elitistas para a educação, dado que as ausências nas políticas ampliam as carências no campo cultural e educacional, aprofundando a reprodução da dualidade classista em todas as áreas. Somos o 8º país em número de analfabetos adultos segundo o Relatório da Unesco de 2014.
Para nicho mercadológico, a educação é um dos setores mais rentáveis, a partir do descaso e ausência proposital do Estado. Além da falta de investimento nas instituições públicas, o setor privado ainda se beneficia de atuar em um mercado estimulado pelo governo em programas de financiamento, sem falar da facilidade de abertura de cursos na modalidade a distância em todo o país.
Ao mesmo tempo, ela destaca a resistência da juventude, que ocuparam as escolas públicas em diversas cidades, se contrapondo à lógica de que “educação é mercadoria”.
Em 2004, surgiu o grupo Escola Sem Partido (ESP), fortalecidos por, e mutuamente fortalecendo, o quadro discursivo dessa forte aliança; não por acaso, um ano após o início a gestão do presidente Lula. De acordo com o documento disponível no site do ESP, o grupo se autodenomina "uma iniciativa de alunos e pais preocupados com o nível de contaminação político-ideológico das escolas brasileiras, em todos os níveis: desde ensino fundamental até o ensino superior”.
A primeira investida, que o O Programa Escola Sem Partido ia configurar uma proposta legislativa de inclusão efetiva de suas bases ideológicas a um sistema de educação particular (o estado do Rio de Janeiro, neste caso), realizado a partir de um pedido de Flávio Bolsonaro (na época, deputado estadual do Rio de Janeiro) a Miguel Nagib (coordenador do movimento) que, usando suas habilidades jurídicas como advogado, elaborou um Projeto de Lei articulando as bandeiras da Escola Sem Partido.
O referido documento, Projeto de Lei nº 2.974/2014, foi apresentado em 15 de maio de 2014, pela primeira vez, perante a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro. Mais tarde, outra muito semelhante, nº 867/2014, foi apresentado perante a Câmara Municipal por Carlos Bolsonaro, quando era vereador do Rio de Janeiro.
Dessa forma, a divulgação do Programa Escola Sem Partido no legislativo contou com grande apoio da família Bolsonaro, cuja discurso foi incluído no programa de governo do candidato a presidente (explicitamente), e continua a ser renovado em suas declarações públicas. Nesse processo, o grupo Escola Sem Partido teve a a adesão de uma ampla rede de apoio político em nível nacional, além da família Bolsonaro, que lhe garantiu esse papel.
Essa faceta "moralista" estimula a intolerância (e, em certa medida, violência) contra expressões de identidades de gênero (LGBTQIA+ Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros) e contra religiões de origem africana. Esta posição encontra eco na grupos aqui chamados de cristãos conservadores (católicos). Além disso, é uma tentativa de controlar os corpos e esconder as desigualdades e violência inscrita nas relações de poder.
O discurso excludente encontra terreno fértil em um país cuja hierarquias de classe, raça e gênero ainda são “naturalizadas” em detrimento do discurso republicano (ou, se preferir, o dos direitos), e que se expressam nas profundas desigualdades e nas relações autoritárias social (com características de violência simbólica).
Essa "visão de mundo" domina o imaginário das "elites" e propaga-se como regime de verdade, circunscrevendo-se no debate sobre as desigualdades educacionais, retroalimentando os quadros discursivos que, pela tendência conservador.
Embora o discurso neoconservador destina-se a minorias privilegiadas, tem uma vasta adesão em diferentes setores populares. Paulo Freire explica que a adesão, até certo ponto, na Pedagogia do Oprimido, quando relata como o oprimido e o oprimido se identificam com o discurso opressor (Freire, 2005).
Desta forma, fortalece-se a mobilização da Escola Sem Partido e reforça-se mutuamente no quadro discursivo derivado dessa forte aliança, difundindo-se nos campos educacional, civil, político partidário e legal, e começa a influenciar eloquentemente o Esfera legislativa relacionada com a Educação.
Os sistemas de negócios são apresentados como uma solução para "problemas educacionais", tornando do cargo de docente uma mera função técnica. De certo modo, despolitiza e esvazia a figura docente de sua autonomia pedagógica.
Em abril de 2021, educadores, estudantes e instituições sem fins lucrativos espalham uma carta denunciando o “apagão educacional”, o que é justoo que está acontecendo no Ministério da Educação. A realização do documento da ONG Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (CENPEC), conseguiu articular outras instituições e políticos para denunciar a indiferença atual gestão para a educação pública.
O documento cita a ataque aos direitos a partir do desmantelamento de políticas que existiam anteriormente e, sobretudo, denuncia a mudança recente nas especificações do Programa Nacional do Livro Didático, que aceita o trabalha com conteúdo que abrange preconceito racial e de gênero.
Material utilizado
http://www.cfess.org.br/visualizar/noticia/cod/1272
https://www.clacso.org.ar/libreria-latinoamericana/inicio.php
